Herdeiros fiéis: leia especial sobre o Zebu, desde as importações da década de 1960 ao século XXI
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Publicado em 25/10/2016 às 09:00:08
- atualizado em 25/10/2016 às 14:00:10

O CRPBZ reproduz (em Histórias & Estórias) uma excelente reportagem intitulada Herdeiros Fiéis, publicada pela revista Globo Rural há seis anos atrás. O especial fala sobre a trajetória de vida de alguns pecuaristas relevantes para o clássico ciclo de importações do Zebu ocorrido na década de 1960, com ênfase nas transformações que marcaram o desenvolvimento da bovinocultura brasileira nos últimos anos. Alguns deles, ou outros herdeiros da empreitada, estão ainda na ativa e contribuem muito para o sucesso da pecuária zebuína atual. Leia-a, na íntegra, a seguir.
Touros nelore, como Ludy de Garça (ao lado, com o peão Davi, na foto de capa da primeira edição de Globo Rural), esparramaram genética e revolucionaram a pecuária brasileira, transformando o país no maior exportador mundial de carne. Ludy gerou mais de 100 mil bezerros por inseminação artificial, entre eles Pamu, um de seus netos - capa da edição. Quando o primeiro número da revista chegou às bancas, a média de abate era de sete anos - hoje é de 4,5 anos, e algumas fazendas conseguem fechar o ciclo em 2,5 anos. A taxa de desfrute (porcentual do rebanho abatido por ano) passou de 17% para 25%.
O rebanho saltou de 150 milhões para quase 200 milhões de cabeças. Há 25 anos, o Brasil ainda importava carne. Hoje, fatura mais de 4 bilhões de dólares ao ano com exportações. "Só na última década, a pecuária de corte avançou meio século", afirma um fazendeiro. Os reprodutores transmitiram aos herdeiros a capacidade de "produzir bife em larga escala" sob o olho gordo dos fazendeiros pioneiros e seus descendentes. A introdução do gado zebuíno no Brasil é uma saga digna de ser contada. E quem o faz a seguir é Chico Carvalho, único pecuarista vivo da derradeira importação da Índia.
Três longos apitos quebraram o silêncio da calorenta manhã no porto da antiga Madras, sul da Índia, anunciando a partida do navio Cora rumo ao distante Arquipélago de Fernando de Noronha, nordeste do Brasil. Em três abarrotados andares se espremia uma carga nada comum: 286 cabeças de gado nelore, gir, guzerá, cangaian, além de búfalos, cabritos, galos, galinhas e até plantas - verdadeira arca de Noé. O calendário marcava 21 de novembro de 1962. A viagem durou 42 atribulados dias. "Até hoje escuto aqueles apitos. Sons aflitos que me acompanham no dia e na noite", afirma o fazendeiro Francisco José de Carvalho Neto, o Chico, de Campo Grande, MS.
Enquanto fala, observa com saudade as dezenas de fotos amareladas pelo tempo nas paredes de seu escritório. São imagens de bois, muitos bois, e de companheiros corajosos que permaneceram até um ano na Índia em jornadas a pé, de bicicleta ou jipe pelas aldeias no rastro do zebu. Como José da Silva, o Dico, peão famoso devido à capacidade de reconhecer por meio de um simples olhar se uma rês carregava ou não futuro.
Chico foi um dos quatro membros da comitiva que cuidou dos bichos indóceis na travessia dos oceanos Índico e Atlântico e dos mares Vermelho e Mediterrâneo. Tinha 20 anos de idade. A viagem entrou para a história por ter sido a última a importar gado hindu em pé e por simbolizar o "espantoso" crescimento da pecuária de corte nacional nos últimos anos. Logo depois, o governo brasileiro fechou a porteira e proibiu a compra de animais da Ásia, temendo doenças.
Chico é o único pecuarista vivo do grupo. Perto de completar 69 anos, é herdeiro de uma das lendas da seleção de nelore no Brasil, o mineiro Rubico Carvalho, arquiteto da derradeira viagem junto a outros veteranos desbravadores do milenar (5 mil anos) e "sagrado" tesouro genético da Índia, entre eles, Torres Homem Rodrigues da Cunha e Nenê Costa, igualmente nascidos nas montanhas de Minas e já mortos. Eles não participaram da travessia. Saíram antes para ajudar Rubico a preparar a logística do também penoso desembarque, visto que não existia porto em Fernando de Noronha (RJ) e alguns animais, ao serem transferidos para uma chata, se espatifaram na água. O próprio Chico pulou no mar a fim de salvar uma vaca. "Arrisquei e consegui, mas meu pai e o Torres Homem ficaram bravos com a ousadia."
O fazendeiro relata que o dia a dia nos oceanos foi marcado por sofrimentos - de homens e bois -, com escassez de água e comida, calor insano no Índico e frio de doer no Mediterrâneo, medo diante dos riscos e, acima de tudo, determinação. "Já na primeira semana éramos nós e a boiada passando mal; tontos e vomitando sem parar no balanço das ondas gigantescas e infernais. Pior é que esquecemos o remédio em terra." Às vezes, sobre o Índico revolto, as esperanças quase naufragaram. Um galo caiu no mar e desapareceu.
O cargueiro Cora, construído na Dinamarca e que já havia feito o itinerário, transportava a genética da moderna pecuária tropical, como os touros nelore premiados e comprovados na reprodução, entre eles, Karvadi, Taj Mahal e Godhavari, principais responsáveis pela divisão da pecuária brasileira em duas fases: antes e depois deles. Eles imprimiram características importantíssimas em termos de resistência, produção e produtividade, superando outras raças tropicais trazidas pelos colonizadores ou formadas no país, como indubrasil, caracu, franqueiro, gir e mestiços. O boi "brasileiro" de então, que pesava 13 arrobas em 1963, passou a 17, 18 arrobas já nos anos 70. A pecuária nacional deu um salto colossal à frente.

Infográfico O Zebu no Tempo (Revista Globo Rural, 2010)
A aventura de Chico Carvalho não foi a primeira em busca de gado da Índia. Em 1893, 70 anos antes, o farmacêutico e fazendeiro Teófilo de Godoy (mineiro também) passou 360 dias em alto-mar (ida e volta), desembarcando no Brasil com 15 animais - saga registrada no Museu do Zebu de Uberaba. Mais tarde, em 1918, houve o caso dramático de João Martins Borges, outro criador de Minas Gerais. Ele morreu na Índia e por lá foi enterrado.
Nas décadas de 50 e 60, o pecuarista Celso Garcia Cid, radicado em Londrina, PR, viajou à Índia diversas vezes e percorreu o vasto território atrás do nelore e do gir. Em 18 de agosto deste ano, a Associação Brasileira dos Criadores de Zebu (ABCZ) eternizou quatro "visionários" ao inaugurar seus bustos de bronze no Parque Fernando Costa, em Uberaba: Rubico Carvalho, Torres Homem, Nenê Costa e Celso Garcia. Em todas essas odisseias, os pecuaristas aventureiros trouxeram para o Brasil apenas 6.262 cabeças zebuínas - em 500 anos de descobrimento, havia entrado no país 1 milhão de reprodutores e matrizes europeus.
Assim, foram pouco mais de 6 mil animais indianos a provocar uma revolução. Para se ter ideia, o rebanho bovino brasileiro atual é de cerca de 195 milhões de exemplares e mais de 80% dele tem sangue originário da Índia. Dos 156 milhões (os 80%) de pedigree hindu, número próximo aos 125 milhões é nelore. E foram os touros dessa raça, na Índia chamada ongole, extremamente férteis, que desempenharam papel decisivo na "explosão" quantitativa e qualitativa da pecuária brasileira.
O destaque maior é Karvadi, que virou o pai da linhagem nelore no Brasil, com presença em pelo menos 70% do rebanho. O genearca, morto em 1972, foi trazido por Torres Homem, que vendeu um prédio de 12 andares em Belo Horizonte, MG, exclusivamente para pagar o animal. Quatro vezes grande campeão nacional de pista na Índia, Karvadi chegou em 1962, e a coleta de sêmen teve início em 1966. "Filas de fazendeiros eram formadas na central de meu pai, a VR, tentando comprar um bezerrinho de Karvadi. A maioria voltava de mãos vazias.
Depois chegou a inseminação artificial, técnica que democratizou a genética, ao vender doses de sêmen a preços acessíveis", diz Torres Lincoln Prata Cunha, um dos herdeiros de Torres Homem. Mais tarde, já no Brasil, nascia outro reprodutor top, Ludy de Garça, na cidade de Garça, interior paulista, que foi capa da primeira edição de Globo Rural, em reportagem de José Hamilton Ribeiro e Ernesto de Souza. Na década de 90, Ludy espantou o país ao produzir 100 mil filhos por inseminação artificial, performance reprodutiva jamais alcançada até então.

Torres Lincoln, filho de Torres Homem, continua lapidando a linhagem Karvadi em sua fazenda de Uberaba. Revista Globo Rural, 2010.
"As centrais de inseminação tornaram o preço do sêmen barato, facilitando o acesso à genética de ponta por parte dos médios e pequenos pecuaristas. Hoje você acha ampola de bons reprodutores entre 10 e 30 reais", diz Gabriela Tonini, analista da Scot Consultoria, de Bebedouro, SP. Rapidamente, segundo ela, veio a colheita farta. No número de animais abatidos no país, por exemplo, houve um salto de 24,838 milhões de cabeças em 1994, quando o IBGE divulgou as primeiras estatísticas oficiais, para 40,358 milhões em 2009, ou seja, 62,5% a mais. Já a produção de carne foi incrementada em mais de 50% em igual período, de 5,920 milhões para 9 milhões de toneladas/equivalentes/carcaça. "Supre o mercado interno e sobra para a exportação", observa Gabriela. Importante em termos econômicos, na visão da analista, foi a queda na idade de abate do gado, de 6,5 anos para uma média nacional de 4,5 anos.
"Em fazendas que detêm mais tecnologia, e elas são muitas, a idade despenca para 2,5 anos. São ganhos fantásticos num espaço curto de tempo. Não conheço exemplo semelhante em outro país." Gabriela ressalva que não somente os bois são os responsáveis pela melhoria. "Manejo, alimentação, tecnologias ainda mais avançadas, como a FIV (fertilização in vitro), e atenção à sanidade nortearam o Brasil rumo à modernidade. Sob todos os ângulos que olhamos, notamos progresso." Evoluiu também a lotação de animal por hectare, e esse quesito tem vitaminado o caixa nas fazendas.
Do tímido 0,89 cabeça por hectare no início da década de 90, houve aumento para a média de 1,12 cabeça por hectare no final de 2009. Já o rebanho não cresceu tanto, foi de 158,243 milhões de animais para 194,578 milhões, acréscimo de 23%, o que traduz ganho de produtividade, explica Gabriela. Ela afirma que os números de meados dos anos 80 deixam muito a desejar. "Foi ao final daquela década que o agronegócio acelerou."
Fazendeiro paulista, Paulo de Castro Marques mostrou, no início do mês passado, que o produtor podia obter lucro de até 25% "administrando bem a atividade, o que torna a pecuária um dos investimentos mais remuneradores do momento". A arroba estava cotada a 90 reais (cerca de 51 dólares). "Há duas décadas, o criador festejava quando o valor da arroba ultrapassava a barreira de 20 dólares." O retrato é sazonal, pontua, mas o produtor deve aproveitar e preparar o futuro. E ele tem feito isso, segundo Marques.
"A pecuária brasileira avançou meio século na última década", afirma. "Veja o caso da taxa de desfrute (porcentual do rebanho abatido por ano), que passou de 17% para 25%." O futuro é promissor na visão de José Vicente Ferraz, da paulista Agra-FNP. Segundo ele, o consumo interno e externo de carne vai aumentar devido à melhora do padrão de vida das populações. Enquanto isso, exportadores tradicionais como Austrália, Estados Unidos e Argentina sofrem com clima, políticas populistas - caso do país vizinho - e principalmente com a escassez de pasto a gerar custos.
"O Brasil é um dos poucos que ainda têm terra para a expansão e pode elevar o ganho de produtividade", diz. Ferraz avisa, porém: "É preciso diminuir os extremos entre as fazendas de alta tecnologia e as que praticam ainda uma pecuária rudimentar. Além disso, antigas lições, como a rastreabilidade, estão sendo esquecidas, e os compromissos ambientais definitivamente são incorporados ao cenário das propriedades, exigindo atenção".
O Brasil, que é o maior exportador mundial de carne, deverá manter-se no topo, acredita Ferraz. Em 1985, o país não exportava nada, em 1994 embarcou 312 mil toneladas e, no ano passado, vendeu ao exterior 1,020 milhão de toneladas. Faturou 4,1 bilhões de dólares e a expectativa é haver um incremento de 20% até dezembro próximo. Nesse ritmo, baseado em números da Embrapa, em 2030 o rebanho nacional poderá chegar perto de 250 milhões de cabeças. O fato é que na pecuária bovina de corte os números são "espetaculares", embora o topo da pirâmide ainda não tenha conseguido repassar "integralmente" seus ganhos para aquele produtor da base da cadeia. Mas o Brasil está a caminho.

Jaiminho Miranda, herdeiro único de seu Jaime, na Estância JM, onde Ludy reinou por 17 anos. Revista Globo Rural, 2010.
E, como o fenômeno Ludy de Garça, que, doente (artrose) teve uma morte lenta e sofrida em 1997, outras "fábricas" de produção de sêmen surgiram, como Fajardo da GB (mãe linhagem Taj Mahal), que produziu impressionantes 460 mil doses, recorde brasileiro, e gerou 270 mil filhos; ou Enlevo, neto de Ludy, com mais de 370 mil ampolas vendidas, e que, aos 16 anos de idade, rumina tranquilo o outono do patriarca doando poucas doses na Alta Genetics, de Uberaba; e na Lagoa da Serra, em Sertãozinho, SP, está o reprodutor sensação do momento, Backup. Ele faz 10 anos neste mês e ultrapassou as 400 mil doses de sêmen. "É o próprio futuro", diz Ricardo Abreu, gerente da CRV Lagoa. "Deve superar Fajardo, já morto." Esses touros - são dezenas os que produziram mais de 200 mil doses de sêmen - deixaram ricos muitos de seus proprietários.
A explosão da pecuária de corte se deve ainda a um encontro feliz: o do nelore com o capim-braquiária, que tomou força no Centro-Oeste a partir da década de 70 com o povoamento e a abertura de grandes propriedades nos cerrados, afirma Duda Biagi, então presidente da ABCZ, entidade que computava 10,6 milhões de animais registrados em 31 de agosto último - eram 2,6 milhões há 25 anos. Já o número de criadores sócios, que era de 5 mil, subiu para os atuais 18 mil. São saltos monumentais.
Quanto ao braquiária, explica Duda, é mais nutritivo do que os capins gordura e jaraguá, antigamente predominantes. "É só soltar a vaca nelore que ela pare o bezerro sozinha, e sem ajuda do peão, ele se põe em pé para mamar." Em Mato Grosso, estado que abriga o maior plantel bovino, os números impressionam e dão validade à argumentação de Duda. Em 1993, eram 9,3 milhões de reses. Pulou para 18 milhões em 1999 e fechou 2009 com 27 milhões de cabeças. Em apenas 17 anos, houve acréscimo de quase 18 milhões de bois nos pastos mato-grossenses. Tudo isso não teria sido possível não fossem ainda os "100% de adaptação da raça nelore ao clima quente do país," enfatiza Duda.

Eduardo Penteado é adepto da primeira linhagem a dar entrada no Brasil, a Lemgruber. Revista Globo Rural, 2016.
"Guardadas as proporções, as experiências em meu estado não diferem do que ocorreu no Vale do Silício, EUA, com a eletrônica e a informática", afirma Rui Prado, presidente da Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso (Famato). "A absorção do rebanho nativo pelo nelore, as pastagens cultivadas, a distribuição da genética e outras tecnologias foram profissionalizando os médios e pequenos produtores. Com a inseminação artificial, ninguém precisou mais adquirir touros caros", diz. "E agora está chegando outra revolução, que mira principalmente o médio e o pequeno. São os programas de melhoramento genético. Eles permitem adquirir qualidade comprovada cientificamente a preços que cabem no bolso dos criadores."
E mais: o país, que já é o maior produtor de FIV (fertilização in vitro) de todo o mundo, além de melhorar seu gado com o emprego de marcadores moleculares, clones e sexagem, incorpora neste ano a tecnologia denominada vitrificação de embriões. Ela possibilita a preservação mais eficaz e segura das células e tecidos presentes no material genético, garantindo uma taxa de prenhez de no mínimo 30%, muito acima dos 10% obtidos pelo método tradicional. A técnica foi apresentada na ExpoZebu de 2010, em maio.
Se os produtos dos touros excepcionais herdaram a potencialidade deles, os filhos dos fazendeiros seus proprietários deram prosseguimento ao legado dos pais. Como Jaiminho Miranda, 59 anos, sucessor de Jaime Nogueira Miranda, que descobriu Ludy, uma "montanha de músculos", junto com o peão Benedito Ferreira, o seu Bê. Jaiminho aprimora o plantel na mesma Estância JM do pai, quase abraçada pela cidade de Garça, e com seu Bê, 77 anos, aposentado, mas ainda dando suas opiniões. Jaiminho reduziu o plantel visando focar na qualidade. Trabalha com 80 matrizes doadoras e faz muita coleta, assim os resultados surgem mais rápidos. "Daqui sai a nata: campeões de pista e tourinhos comprovados", afirma.
A aposta de Jaiminho é no touro Pamu, um neto de Ludy de Garça de 4 anos de idade. Bom de peso, como o avô, Pamu vai transmitir muita carcaça aos seus bezerros, segundo o proprietário. "Como Ludy, ele vai fazer os filhos produzir muito bife." E nas imediações de Uberaba fica a Estância Poty. É lá que Torres Lincoln Prata Cunha, 66 anos, "filho do meio" de Torres Homem, continua melhorando o gado que provém de Karvadi e experimentando outras linhagens. "O rebanho de elite eu conservo na Poty, onde faço transferência de embriões usando vacas receptoras", diz Lincoln, que possui fazendas ainda em Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, onde engorda boi.
O criador aposta no potencial produtivo do bezerrinho Poty VR Jhopur, de 9 meses de idade e cuja linha termina em Karvadi. Segundo Lincoln, todos os filhos de Torres Homem estão ligados à pecuária. "Junto com outros selecionadores, meu pai foi um visionário. Se aventurou na Índia no rastro do nelore, e todo o Brasil colheu os frutos." Ele usa uma frase emblemática: "O desbravador de nosso país foi o nelore". E tem mais, afirma Lincoln: a raça está em todos os estados, em menor quantidade apenas no Sul, pois lá predomina gado de origem europeia, como angus, charolês e hereford, que se dão bem sob temperaturas baixas.
"A noite é a sombra para o nelore." A citação é de Chico Carvalho para definir a adaptação plena da raça aos ensolarados pastos brasileiros. Chico continua o trabalho do pai, Rubico, tendo por bússola a linhagem Godhavari, que gerou Kurupathy (nascido no quarentenário em Fernando de Noronha), que é pai de Amedabad. Este último foi o grande marco da seleção de Rubico, chamada Brumado, e gerou uma prole imensa. Chico pratica a pecuária seletiva - tem 300 fêmeas doadoras - e é invernista. Produtor de tourinhos junto com seu filho, Rubens Andrade Carvalho Neto, oferta 250 anualmente em leilões. Além da fazenda de Campo Grande, Chico faz seleção apurada noutra propriedade em Porto Murtinho, MS, a Arroio Sexto. Seus irmãos resolveram liquidar o plantel de Rubico, que morreu em 2009, numa série de remates realizada neste ano. Chico não topou. Preferiu pegar a parte que lhe coube e levá-la para a fazenda.
Outro apaixonado pelo nelore é Eduardo Penteado, 60 anos, adepto da linhagem lemgruber, a primeira a dar entrada no Brasil. Ele é herdeiro do pecuarista Fernando Penteado Cardoso, ex-dono da Manah, hoje com 92 anos. Foi Fernando quem, em 1974, levou o sangue lemgruber para o criatório que mantinha no município de Brotas, em São Paulo. "Meu pai selecionava nelore PO de várias origens, mas inquestionavelmente foi a lemgruber que acrescentou carne à boiada", diz Eduardo, que tem como sócio o irmão Fernando Filho. Mais tarde, em 1983, nascia o touro 1646, um dos maiores vendedores de sêmen do país e que projetou definitivamente a Fazenda Mundo Novo no cenário da pecuária de elite. Em Uberaba, a Mundo Novo tem um plantel de 3.500 cabeças - e 1.500 são matrizes. Touros pedigree 1646 doam sêmen em várias centrais.
Texto: Sebastião Nascimento
Fotografia: Ernesto de Souza
Fonte: Revista Globo Rural (Edição nº 300 - Outubro / 2010)
Adaptação: Equipe do CRPBZ
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