Especial: Fazenda Carnaúba mantém o lema do balde cheio Voltar

Você está em: Memórias do Zebu » Museu do Zebu » Histórias & Estórias Publicado em 16/11/2016 às 15:27:32 - atualizado em 16/11/2016 às 15:55:20
Fachada da Fazenda Carnaúba, na Paraíba, onde durante algum tempo Ariano Suassuna refugiou-se para inspiração de suas obras.

Somente um sertanejo legítimo, que aposta na pecuária como a melhor maneira para viabilizar uma vida digna ao povo do Sertão, poderia falar com propriedade sobre a importância do gado zebuíno para o desenvolvimento do Nordeste brasileiro. É graças às raízes no Sertão que o criador e engenheiro Manoel Dantas Vilar Filho procura manter-se fiel às possibilidades que a terra do Nordeste oferece a quem se dispõe a respeitá-la, conservando suas características naturais.

*Por Thassiana Macedo / Luiz do Berro

O Semiárido nordestino tem como traço principal as frequentes secas, que podem ser caracterizadas pela ausência, escassez, alta variabilidade espacial e temporal das chuvas. Não é rara a sucessão de anos seguidos de seca. As características desse tipo de meio ambiente condicionam a sociedade regional a sobreviver, principalmente, de atividades econômicas ligadas à agricultura e a pecuária, mas especialmente da criatividade.

 

É assim que, em pleno Sertão nordestino, o criador e engenheiro Manoel Dantas Vilar Filho, mantém firme produção, em uma região onde as dificuldades climáticas poderiam ser um empecilho a qualquer tipo de atividade agropecuária. Entusiasta e criador das raças Guzerá e Sindi, Manelito afirma, em entrevista ao Centro de Referência da Pecuária Brasileira - Zebu (CRPBZ), que procura valorizar a rusticidade não somente na vocação leiteira, mas também na possibilidade de investimentos na boa aptidão para corte.

 

Em sociedade com o seu primo-irmão, o saudoso escritor e dramaturgo Ariano Suassuna, Manelito aprendeu a lidar com tudo o que envolve solo e vegetação para sobrevivência ao longo da seca. Juntos, iniciaram não somente a criação de cabras, mas desenvolveram através de estudos técnicos, o cultivo de plantas nativas e de animais aptos à região, resultando hoje na criação das raças Guzerá e Sindi. Aliaram qualidade e altos índices de povo do Sertão, poderia falar com propriedade sobre a importância do gado zebuíno para o desenvolvimento do Nordeste brasileiro.

 

Somente um sertanejo legítimo, que aposta na pecuária como a melhor maneira para viabilizar uma vida digna ao povo do Sertão, poderia falar com propriedade sobre a importância do gado zebuíno para o desenvolvimento do Nordeste brasileiro. É graças às raízes no Sertão, que o criador e engenheiro Manoel Dantas Vilar Filho, procura manter-se fiel às possibilidades que a terra do Nordeste oferece a quem se dispõe a respeitá-la, conservando suas características naturais. Para manter o lema de balde sempre cheio, as fazendas Carnaúba e Pau Leite, ambas localizadas no Estado da Paraíba, contam com boas matrizes e reprodutores.


Foto recente de "Seu Manelito", na fazenda Carnaúba, em Taperoá, no Estado da Paraíba.

"Minha escolha pelo Sindi decorre da minha ligação com as terras secas do Nordeste e da crença radical de que é preciso respeitar a harmonia entre os animais e as latitudes. Meu pai, desde 1934, já criava e ordenhava guzerás de Cantagalo (RJ), e eu me limitei a seguir sua lucidez e sua experiência de vida no Cariri das secas. Com a morte de seu Joãozinho Abreu, nos anos 70, simultaneamente à segurança que adquiri no uso dos capins perenes, que consegui importar da Austrália, fui buscar outro Zebu leiteiro dos pré-desertos da Ásia, temendo que não desse para ficar tudo no Guzerá JA, puro e bom de leite. Se não tiver leite, não é Guzerá e nem é Sindi. O Sindi, de rebanho complementar, já é hoje metade do gado total que eu crio", destaca.

 

Entre os exemplares da raça complementar se destacam as vacas Mabiroba- D e Parafina-D e os touros Iaque-D e Danúbio-FC, este último, recordista nacional na avaliação genética da Embrapa Gado de Leite. Salientando a vocação nordestina, o criador investe também na criação de Guzerá e ainda em ovinos e caprinos. "Costumo dizer que se confunde muito o conceito de 'volume aparente' com o de 'peso específico' ou rendimento. O menor porte do Sindi é uma virtude para efeito de precocidade, prolificidade e velocidade de ganho em peso, mas a longevidade do Guzerá é maior. O conjunto das duas raças, rústicas, leiteiras, fisiologicamente perfeitas para a fotossíntese do mundo tropical é fantástico. Sem, contudo, misturar raças, indo contra conceitos básicos da Zootecnia", questiona o criador.


Animais zebuínos da raça Guzerá, criados na fazenda Carnaúba.

A solução para superar as adversidades, segundo Manelito, está no desenvolvimento da técnica de se criar animais resistentes à seca e a introdução e cultivo de plantas adaptadas ao clima nordestino. O Semiárido brasileiro é o mais rico do mundo em leguminosas, que vem a ser a proteína da ração animal. A vargem da faveira, por exemplo, contém 24% de proteína bruta, o que é raro entre os vegetais. No início do século passado, os australianos estiveram em Taperoá, para buscar sementes de pequenas plantas. Para se criar uma rês precisa-se de 15 hectares de terra de mata nativa, enquanto um hectare de capim búfalo sustenta mais de um animal.

 

Dia D na Fazenda Carnaúba

 

O Dia D na Fazenda Carnaúba, em Taperoá (PB), já é um tradicional evento de comercialização, divulgação e difusão de conhecimentos sobre o Semiárido nordestino, bioma Caatinga, raças bovinas Guzerá, Sindi, Gado Pé Duro, cabras e ovelhas nativas, galináceos e palmípedes, bem como de vegetais de usos forrageiros nativos ou implantados, artes, artesanatos, música, gastronomia regional e confraternização entre os criadores.

 

Este ano, o evento foi realizado em julho e reuniu criadores e apaixonados pela pecuária de todo o país, o que resultou em um aumento de 36% nas vendas de animais, 20% de crescimento no faturamento e uma ampliação de 73% no público visitante, em relação à Edição de 2015. O Dia D apresentou a produção de queijos e os cortes especiais de carnes caprinas e ovinas; o artesanato com peles, que bem demonstram o acerto na condução da Fazenda Carnaúba; na convivência harmônica entre a pecuária e o Semiárido.

 

Seguindo na contramão das migrações em direção ao litoral ou ao Centro Sul do Brasil, a Fazenda Carnaúba poderia ser chamada apropriadamente de "Universidade do Mandacarú", visto que o engenheiro Manuel Dantas Vilar, 9ª geração da família na região denominada Cariri Velho, reúne um importante acervo de conhecimentos e práticas de boa convivência produtiva no bioma Caatinga, o qual é aberto para os mais variados produtores todos os anos.


O ecritor e dramaturgo paraibano Ariano Suassuna era sócio e primo de Manelito. Foto: G1, 2016.

Ao longo de quase 50 anos de dedicação para reverter a cultura de "combate à seca", Manelito e seu primo, amigo e sócio, o saudoso escritor Ariano Suassuna, foram em busca de elementos biológicos, animais ou vegetais, compatíveis com a região semiárida, tornando a fazenda um verdadeiro santuário das cabras e ovelhas nativas ou nativisadas, por serem secularmente adaptadas, e do gado rústico de dupla aptidão, fundamentado nas raças zebuínas Guzerá e Sindi.

 

Além disso, a Fazenda Carnaúba tornou-se um núcleo de preservação e melhoramento zootécnico do gado Pé Duro do Piauí, de origem ibérica, que também se adaptou bem ao clima nordestino. "Cerca de 90% da pecuária no mundo é feita em áreas secas, a lavoura é então um equívoco, pois como basear-se em índices pluviométricos históricos de 600 mm/ano, se podemos ter anos com 2000 mm e outros com 70 mm? Devemos definir plantas e animais compatíveis com o Semiárido, sem confundir o volume aparente com o peso específico, somando nessas contas: eficiência, custo, beneficio e sanidade animal, assumindo a seca e suas virtudes", avalia Manuel Dantas.

 

Originária da região norte do estado de Gujarat e também criada no Paquistão, na região do deserto de Kutch e distritos de Tharparkar e Ahmedabad, o Guzerá D da Fazenda Carnaúba veio da seleção JÁ, que o coronel João de Abreu de Cantagalo mantinha no Rio de Janeiro, em 1934. Manelito tratou de dar continuidade na Carnaúba, com a mesma orientação de seleção para leite e corte, consolidando a exploração pecuária de dupla aptidão, compatível com o Semiárido nordestino.

 

O Sindi é originário da região do Kohistan, na província de Sind, no Paquistão, nas regiões de Karachi e Hiderabad. Na Carnaúba, a raça teve origem na importação feita em 1952, por Felisberto Camargo, do Instituto Agronômico do Norte no Pará, bem como de animais pertencentes a Rômulo Monteiro e José Cezário de Castilho, que chegaram à fazenda no fim da década de 1970.

 

Lá, passaram a ser submetidos ao controle leiteiro oficial a partir de 1987. Já o gado Pé Duro do Piauí, as cabras e ovelhas nativas ou nativisadas, são descendentes dos animais trazidos por colonizadores ibéricos e secularmente adaptados ao bioma Caatinga, em processo de regeneração e melhoramento dos índices zootécnicos de produção, sem perda dos fatores rusticidade e fecundidade, já consolidados nos rebanhos da Carnaúba.

 

Assista ao vídeo com narração de Manelito Vilar, em especial sobre a Fazenda Carnaúba, o Zebu e a seca (publicado em 10 de Junho de 2016).

 

Para saber mais, leia também:

Guzerá e Sindi, raças de dupla aptidão (entrevista com Dr. Manelito Vilar) - CRPBZ

 

Fotos: Arquivo Pessoal da produção da Fazenda Carnaúba, em Taperoá, no Estado da Paraíba

Fonte: Revista O Zebu no Brasil (Edição 219, Ano 44, setembro / outubro de 2016)

Adaptação: Equipe do CRPBZ


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