Ordenha sustentável: Cuidados com o bem-estar animal para espantar a baixa produtividade
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Publicado em 13/12/2016 às 12:19:40
- atualizado em 13/12/2016 às 14:45:16
Se a produtividade do rebanho anda em queda, o problema pode estar diretamente ligado ao manejo adotado na hora da ordenha. Uma vaca estressada deixa de produzir até 2 kg de leite por ordenha. É o que comprovou um estudo feito em várias propriedades brasileiras por pesquisadores do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sul de Minas Gerais e do Grupo de Estudos e Pesquisa em Etologia e Ecologia Animal (Grupo ETCO). O manejo inadequado durante a ordenha diminui no organismo da fêmea o nível do hormônio ligado à produção de leite, a ocitocina. O resultado é menos leite no balde.
O pesquisador do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sul de Minas Gerais, Marcelo Simão da Rosa, avaliou o sistema de ordenha e a qualidade da interação dos ordenhadores com as vacas em dezenas de fazendas leiteiras das regiões nordeste de São Paulo, sudeste de Minas Gerais e sudeste do Espírito Santo. Ele passou a aplicar nessas propriedades o conceito de ordenha sustentável: todos os procedimentos, que vão desde a etapa de condução das vacas do pasto para o local de espera até a retirada do leite, devem ser realizados sem provocar estresse nas vacas.
No Brasil, esse conceito ainda é pouco difundido. Já nos principais mercados concorrentes, como Nova Zelândia, Estados Unidos e Europa, a preocupação com o bem-estar animal na hora de ordenhar as vacas é maior. De família ligada à produção de leite, Marcelo Rosa começou a desenvolver pesquisas na área a partir de 2002 quando iniciou mestrado sobre a relação retireiro/vaca. O conceito de ordenha sustentável foi concluído pelo pesquisador anos depois no doutorado. No ano passado, as informações colhidas ao longo dos estudos de mestrado e doutorado ganharam as páginas do manual "Boas práticas de manejo - ordenha". O material foi elaborado pelo Grupo ETCO, que realiza pesquisas sobre desenvolvimento e aplicação da ordenha sustentável desde 2000, pelo Departamento de Zootecnia da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da Universidade Estadual Paulista (FCAV/Unesp, de Jaboticabal, SP), com o apoio da Fort Dodge. Além de Marcelo Rosa, o manual tem como autores Mateus Paranhos (Unesp), Aline Cristina Sant´Anna (ETCO) e Adriana Postos Madureira (ETCO).
Para execução da ordenha sustentável, é fundamental ter mão-de-obra treinada e oferecer boas condições de trabalho para o ordenhador, evitando assim a grande rotatividade de profissionais que existe nessa área. "Nem todas as fazendas têm um padrão adequado de manejo. Em muitos casos, o problema é a falta de mão - de - obra especializada. Em outros, a pessoa contratada não tem habilidade para o serviço. Daí a necessidade do pecuarista sempre fazer uma boa seleção na hora de contratar um ordenhador, evitando a contratação de profissionais fora do perfil", explica Marcelo Rosa. Segundo ele, o ordenhador precisa ser capaz de perceber as necessidades das vacas sob seus cuidados, gostar dos animais e de seu trabalho, pois um manejo mais agressivo por parte do retireiro acaba provocando estresse no rebanho e queda na produtividade.
Mastite
Além do manejo incorreto, outro problema detectado durante as pesquisas foi a falta de conhecimento dos ordenhadores para detectar adequadamente a mastite clínica. De acordo com o médico veterinário e gerente de produção para gado de leite da Fort Dodge, João Marcelo Gomes, a mastite representa 50% dos gastos com medicamentos nas fazendas leiteiras. "Um animal em pleno pico de lactação que apresenta mastite tem sua produção reduzida de 30 litros/dia para aproximadamente 15 litros, e dificilmente retorna à mesma produção após a doença. Se considerarmos que uma perda de 5 litros permanecerá até o final da lactação e se multiplicarmos esta perda pelos dias em leite de uma lactação normal, conseguimos calcular o prejuízo", alerta Gomes. Segundo o médico veterinário, o produtor pode utilizar a seguinte fórmula para verificar o tamanho do prejuízo com a perda de leite em decorrência da mastite:
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A conta do prejuízo não se restringe somente à queda da produtividade. O produtor deve contabilizar também os custos com medicação e o que deixará de arrecadar devido ao descarte do leite durante o período de tratamento da mastite. "Para esta mesma vaca de 30 litros de produção, com o descarte de seis dias (período de tratamento + período de descarte de leite com resíduo), a conta a ser feita é: 6 dias x 30 litros x preço do litro de leite", diz Gomes.
A boa notícia é que as raças zebuínas têm maior resistência à mastite. Outra boa notícia é que o problema reduz significativamente quando os procedimentos corretos de higiene, manejo e tratamento são adotados durante a ordenha já que o maior risco de contágio é logo após essa etapa.
Uma dica importante, dentro do conceito de ordenha sustentável, é evitar a aplicação de medicamentos, bem como outros tipos de tratamentos, na sala de ordenha. "Essas ações geralmente causam desconforto, dor e estresse nas vacas, fazendo com que os animais tenham medo da sala de ordenha e do ordenhador. Defina outro local que seja adequado para a realização dos tratamentos, com boas condições de segurança para os animais e para os responsáveis pelo trabalho".
Ordenha sustentável na prática
Os pesquisadores garantem que a ordenha sustentável deixa as vacas mais calmas. Segundo o pesquisador Marcelo Rosa, os zebuínos aprendem mais rápido os comandos da ordenha sustentável que os taurinos. "Melhorou bastante depois do treinamento. Antigamente para as vacas entrarem na ordenha era preciso bater, agora é só chamar e bater palmas que elas entram. Mesmo as primíparas, é só deixar a porta aberta que elas entram sozinhas na ordenha. O serviço também diminuiu, antes precisava de uma pessoa a mais para tocar as vacas", diz em depoimento aos autores do manual o ordenhador de São Paulo, Claudionor Florisvaldo da Silva.
Confira algumas dicas para desenvolver a ordenha sustentável
Conduzindo as vacas do pasto ao local de espera
A condução das vacas deve ser feita com calma, sem correr e nem gritar. O ideal é que as vacas andem para o local da ordenha por vontade própria. Para tanto, a condução deve ser realizada sempre pela mesma pessoa e de preferência no mesmo horário. Não faça movimentos bruscos, não grite, não use instrumentos de agressão (pau, corda, chicote, ferrão e bastão elétrico) e nem bata nos animais; chame as vacas pelos nomes; estimule-as a andar batendo palmas e assoviando e, quando necessário, dê tapinhas na garupa.
Local de ordenha
Ao chegar nesta área, acomode as vacas no curral ou na sala de espera e espere alguns minutos para que descansem antes de iniciar as outras atividades. Não coloque muitas vacas na sala de espera, pois elas ficam estressadas, além de ser mais difícil conduzi-las para a sala de ordenha. Condução das vacas para a sala de ordenha Não force a entrada das vacas na sala de ordenha; respeite a ordem definida por elas próprias. Sempre que se aproximar das vacas chame-as pelos nomes; encoste a mão na sua perna ou no úbere antes de pegar em seu teto. Isto é muito importante para que ela não se assuste com a sua presença, reduzindo o risco de coices.
Formação da linha de ordenha
A ordem com que as vacas são ordenhadas é chamada de linha de ordenha. Esta é geralmente definida com base no diagnóstico de mastite, realizando a ordenha na seguinte sequência:
1. Vacas primíparas (de primeira cria), sem mastite.
2. Vacas pluríparas que nunca tiveram mastite.
3. Vacas que já tiveram mastite, mas que foram curadas.
4. Vacas com mastite subclínica.
5. Vacas com mastite clínica.
Este é um esquema lógico, que deve ser aplicado com a finalidade de evitar a transmissão da mastite contagiosa no momento da ordenha.
Fonte: Revista ABCZ, Ed. nº 54.
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