Do capim ao filé - mignon, por Luiz Antonio Josakhian
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Publicado em 10/04/2017 às 14:40:47
- atualizado em 10/04/2017 às 14:49:22

Sempre fui um admirador do rúmen, esse órgão quase mítico que une o ar, a terra e as plantas em um dos arranjos mais eficientes da natureza. Se pensarmos em adjetivos para o rúmen, encontraremos vários, e todos eles com sentido positivo. Por exemplo, do ponto de vista da hospitalidade, o rúmen recebe, abriga e permite a reprodução de trilhões de bactérias, protozoários e fungos em seu interior. Quanto ao aspecto colaborativo, é um exemplo para todos os outros órgãos, pois produz todas as condições necessárias para uma simbiose perfeita com os microrganismos que o habitam. Quanto à eficiência, ele é capaz de transformar o mais elementar componente do capim, a celulose, em carne e leite. Uma máquina perfeita, em uma simbiose perfeita e ainda sem similares naturais ou artificiais.
Qual outro elemento no mundo é capaz de, recebendo capim de um lado retornar com um belo filé - migno, uma picanha ou um copo de leite do outro lado? Não há sucedâneo na natureza para o rúmen. E a natureza foi pródiga com os ruminantes. São mais de 250 espécies, desde os conhecidos bovinos, ovinos e caprinos até os mais exóticos, como os gnus, alces e renas.
O ciclo bioquímico no qual os ruminantes estão inseridos é de uma perfeição rara. Luz solar + CO2 + água são tragados pelas plantas no milagre da fotossíntese, e elas produzem energia para seu crescimento, além de liberar água e O2 para o meio ambiente.
Os ruminantes comem as plantas, em especial os capins, as digerem em seus estômagos auxiliados por trilhões de bactérias, o que resulta em energia digestível para os bovinos, que a trans formam, por fim, em carne e leite, A microbiota do rúmen é variada e versátil. Composta especialmente por bactérias, conta ainda com protozoários e fungos.
São esses microrganismos (especialmente 20 espécies de bactérias) os responsáveis pela degradação da celulose, hemicelulose, amido e outros substratos em unidades metabólicas utilizáveis pelos ruminantes. O rúmen é uma fábrica com trilhões de micro - operários trabalhando em regime comunitário, Talvez seja um dos poucos exemplos em que o socialismo extremo deu certo.
A harmonia entre o ruminante e seus simbióticos microrganismos se revela em aspectos sutis: o animal mantém a temperatura do rúmen entre 39 e 42 graus centígrados e o pH entre 6 e 7 em um ambiente anaeróbico, formando uma câmara perfeita para a sobrevivência e reprodução de bactérias, fungos e protozoários, que agradecem fornecendo os tijolos estruturais das funções vitais dos ruminantes.
A diversidade da microbiota ruminal também é fascinante: algumas bactérias digerem a celulose e a hemicelulose, previa mente preparadas por protozoários; outras, o amido: outras, os lipídeos: e, por fim, aquelas que digerem as proteínas. O mais intrigante de todo esse sistema é que ninguém es tá no comando, não há um comitê central, não há dirigentes superiores.
Tudo funciona por simbiose e equilíbrio, e talvez por isso mesmo é que funcione. Uma cascata de eventos interdependentes rege o processo e o resultado é essa máquina incrível de produzir carne, leite, lã e couro. Da próxima vez que olha r para uma vaca, uma ove lha ou uma cabra, lembre- se de que ali está um a legião de seres vivos, per feita mente arranjados, simbioticamente em equilíbrio.
Autor: Luiz Antonio Josahkian é Superintendente Técnico da ABCZ.
Fonte: revistagloborural.globo.com (abril de 2017).
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