Causo e Conto - DE ZEBU - Por João Gilberto Rodrigues da Cunha Voltar

                DE ZEBU

                                                                                                    Por João Gilberto Rodrigues da Cunha**

       Zé de Abreu fez da vida um folclore colorido, na profissão médica que abraçou, nas fazendas que teve, nas experiências que viveu entre Araxá, Campos Altos e Uberaba. Bruscão de gestos e falas, não brincava em negócio - secava o bagaço. Deixou causos notáveis neste sentido. De todos, o melhor foi o primeiro, quando aplicou no sogro o seu iniciante e futuramente imbatível senso humorístico-comercial.
       O dr. José de Abreu já clinicava então em Uberaba, casado de pouco com d. Diva, filha do Cel. Ursiano Lemos, da mais tradicional família araxaense. O gado indubrasil do Cel. Ursiano já era famoso neste Brasil e naquela época vendia-se a peso de ouro.
       Zé de Abreu, começando a vida, tentava inutilmente comprar-lhe duas vacas do gado cabeceira, a pretexto de começar uma criação "para a Diva".
       - Estas vacas eu não vendo, Zé. Das outras nós podemos falar quando quiser.
       Zé de Abreu não queria das outras. Ficou político, diminuiu as visitas de Uberaba a Araxá, esticou a saudade que o velho sentia da filha, amadureceu a intenção.
       Na visita seguinte, almoçaram com o Coronel, um frango ao molho pardo com angu e quiabo, uns pães de queijo como só em Araxá fazem. Desceram ao curral, na exibição carinhosa que o velho patriarca fazia do gado, sempre que havia visitantes. Na satisfação do bom almoço, da visita da filha, daquela molência na varanda ensombrada, o coronel estava no ponto. Zé de Abreu desfechou: 
       - Coronel, a Diva vive com saudades de casa. Tá querendo alguma coisa que lembre a família e o pai, e eu vivo pensando em comprar-lhe as duas vacas que falei...
       - Zé de Abreu, eu não nasci ontem. Tou vendo o seu jeitão de sucuri pajeando leitão gordo. Mas não faz mal; já tomei a decisão. Vou vender a você as duas vacas escolhidas. E em justiça vou vender a cada filho que interesse, duas vacas de cabeceira, iguais às suas. Tá certo?
       José de Abreu não mostrou a satisfação toda. Fechou a cara em preocupação que não sentia. Torceu-se na poltrona.
       - Certo, coronel. Muito justo. Agora, o senhor sabe, tem o acerto do preço. Afinal, eu estou começando a vida, moro longe, tem o transporte...
       - Já pensei em tudo Zé. O preço vai ser simbólico, igual para todos. Você vai pagar as vacas a dez contos, vinte contos as duas.
       Vacas de cabeceira indubrasil do Coronel Ursiano Lemos, vendidas, e por aquele preço... um negoção. Mas não para o José de Abreu.
       - Coronel, o preço até não é ruim. Mas o senhor sabe, isto é zebu e é a primeira pedida... Queria saber a diferença que o senhor vai fazer...
       - Diferença uma ova, seu José. Você sabe que meu gado não tem preço, que estas vacas não são de venda, que...
       - Sei tudo coronel, mas sei que todo zebu tem diferença no preço pedido.
       Ai o coronel ficou brabo. Danou, xingou a miséria do genro, o seu espírito oportunista, a exploração sentimental que estava fazendo. O Zé de Abreu, frio:
       - A bronca é normal, coronel. Valoriza a mercadoria.
       Ficaram de mal o resto da tarde, o coronel emburrado, o Zé de Abreu fingindo. Na saída para Uberaba, o coração do velho amoleceu. Chamou o genro:
       - Zé, você é um malandro sem consideração. Não posso fazer diferença no preço. Araxá, Uberaba, todos vão rir de mim. Você faz o seguinte: das duas vacas, uma leve de presente para a Diva, A outra, você paga os dez contos.
       Zé de Abreu pegou de estalo:
       - Certo, coronel. A que é de presente, negócio fechado. Agora, a que é de venda, vamos discutir a diferença que o senhor faz...



                                                                                                                               **do livro O Triângulo de Bermudas
            

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